Hj cedo no Flamengo, bairro onde moro, avistei uma criança preta chorando muito. Cheguei perto. “Oi, tudo bem?”, soltei. “Não tá. Tô sem comer desde ontem. Vim aqui trabalhar e roubaram minha caixa de balas”. Wallace, 12 anos, o + velho dos 4 irmãos, responsável p/comida em casa.


Tinha saído às 6h da manhã de Duque de Caxias, na Baixada. “Quem falou pra vc que aqui seria lugar?” tentei desvendar. “Ninguém. Eu só procurei e vim. Tenho que ajudar minha mãe e minha avó. Meus irmãos comeram arroz e feijão ontem, eu que dei. Mas tive que dar o meu”.


A caixa de balas seria o jeito de reverter a situação. “Pegaram minha caixa de mentos e 20 reais que uma moça tinha acabado de me dar, que ia comprar o feijão. Eu ainda ia ter que guardar dinheiro pra passagem”, me contou. Estava aqui hoje porque não tinha tido aula.


“Mas você tem 12 anos mesmo?” insisti. “Foi o que minha mãe disse”. “Mas você não sabe a data do seu aniversário?”. “Não tio, nunca nem comemorei”. Na cabeça, a única coisa que tinha/tem é a súplica da mãe: “Ela me fala todo dia que é pra eu tomar cuidado”.


Wallace é mais um de três centenas de milhares. Com fome, com a infância roubada, e também uma juventude. Quando olho pra ele, penso na situação política. Analiso os números dessa eleição, o que falam sobre, as propostas, e nada, nada encontra materialização na vida de Wallace.


Que também poderia ser eu, você, seu filho, seu irmão, seu primo. Mas não é. No fim, acompanhei-o até o ponto de ônibus pra que não fizessem nada +. Não sei se encontrei de novo o menino que mora na Rua 14/Parque das Missões. Mas sei que nenhum dia, daqui pra frente, esquecerei


p.s.: sim. fiz uma ajuda de custo pra a volta e para a compra de alimentos em sua casa. A quantia talvez nunca fosse vista por Wallace. O que sei é só a dor de entender que a ajuda preencherá alguns dias da família, precisando que o menino recorrerá, de novo, a situação.


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